A DECLARANTE Cristina Matavel, antiga directora-geral e financeira da EMATUM, disse ontem em sede de julgamento das dívidas não declaradas que o projecto da criação da empresa “começou do fim”, visto que foi invertida a ordem cronológica da sua constituição. Disse ao tribunal que trabalhar no projecto foi um “homicídio profissional”.
Cristina Matavele defendeu a sua tese explicando que, primeiro, foram comprados barcos e lançados à pesca do atum, sem antes se avançar com a criação de instalações para o seu funcionamento, recrutamento e formação dos pilotos e marinheiros, edificação de um talho, frigorífico e sala de processamento do pescado, entre outras condicionantes que permitiriam a empresa funcionar em pleno.
A décima quarta declarante no quadragésimo quarto dia de audiência afirmou que a inviabilidade da EMATUM, onde recebia 400 mil meticais mensais como salário, era tamanha que o período de graça era curto e os juros bastante altos, assim como pagava 44 mil dólares de seguro por cada embarcação e 258 dólares de atracagem também por embarcação.
“A EMATUM começou do fim. As embarcações deveriam ter chegado depois de criadas todas as condições. Quando chegaram, não havia ninguém para pilotar, daí que tivemos de contratar pessoal dos Estados Unidos, Indonésia Uruguai e Madagáscar. Fez-se o inverso, por isso não foi sustentável. Começou-se da morte. Pessoalmente, trabalhar na EMATUM foi um ‘homicídio profissional’”, referiu.
Disse que o atum pescado não teve mercado internacional como o Japão, pois os clientes queriam pescado fresco e dentro de 72 horas, e não congelado, como era o da empresa.
Explicou que recebeu salários na EMATUM, mas já não no Instituto de Gestão das Participações do Estado (IGEPE), de onde saiu para gerir aquela empresa de pesca de atum. À semelhança de outros administradores e PCA da EMATUM, Cristina Matavel recebeu viatura de afectação.
A declarante referiu ainda que as 24 embarcações adquiridas pela EMATUM à Privinvest foram chumbadas pelo INAMAR, daí que tiveram de ser adequadas para a pesca do atum. Tal foi o caso da colocação de escadas e troca de bóias salva-vidas.
Explicou que, quando entrou para a gestão da EMATUM, esta já tinha recebido o empréstimo de 850 milhões de dólares do Grupo Privinvest para a compra das 24 embarcações. Destas, três foram de arrasto, mas nunca foram usados para a procura da isca (lula adequada) para a pesca do atum, que era feita da zona de Bazaruto, em Inhambane, a Ponta do Ouro, em Maputo.
Aclarou que cada embarcação custou 22 milhões de dólares e o custo global das 24 foi de 580 milhões de dólares. Contudo, nunca teve explicação para onde foi o valor de diferença dos 850 milhões de dólares recebidos da Privinvest. Aliás, disse que, pelo facto de não ter fornecido todo o equipamento constante do contrato de financiamento, como é o caso do centro de comando, a Privinvest está a dever à EMATUM.
Anotou que as autoridades marítimas deveriam ter sido integradas no fabrico dos barcos, o que não aconteceu. Do mesmo modo, os gestores da Privinvest criaram um ambiente tortuoso de comunicação, visto que não acatavam nenhuma reclamação vinda da EMATUM sobre os barcos.
Disse que, quando começou a funcionar, em 2014, a EMATUM tinha juros vencidos e que viriam a ser pagos pelo fornecedores, neste caso o Grupo Privinvest. Sublinhou que, mais tarde, a Direcção Nacional do Tesouro assumiu a dívida de 550 milhões de dólares e os restantes 350 milhões de dólares ficaram como dívida da EMATUM.
Referiu ainda que fez um plano de reestruturação e revitalização da EMATUM avaliado em 65 mil dólares e entregue ao Ministro da Economia e Finanças, Adriano Maleiane, que não chegou a dar despacho.
Nas suas respostas ao tribunal, Cristina Matavel referiu que houve uma transferência de 20 milhões de dólares para uma conta bancária que não constava dos registos da EMATUM, mas que tinha como assinantes António Carlos do Rosário, PCA desta empresa, bem como o administrador Henrique Gamito.
Em termos de produção, a declarante disse que a EMATUM produziu 284 toneladas de pescado diverso em resultado de 66 fainas, tendo vendido 49 toneladas e exportado 172 toneladas.
Disse que cessou funções na EMATUM sem que os seus superiores hierárquicos lhe tivessem dado tempo para fechar as contas da empresa. À sua saída, a empresa não tinha outros bens para além de 24 embarcações.
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