Analistas moçambicanos consideram que a morte de Afonso Dhlakama deixou a Renamo numa crise profunda, porque o principal partido da oposição de Moçambique não estava preparado para perder um "líder carismático" que dirigiu a organização como um "messias".
Afonso Dhlakama morreu em 3 de maio de 2018 na Serra da Gorongosa, vítima de doença, encerrando uma liderança que durou 39 anos.
"Ela [a Renamo] está a afundar-se, mas é importante dizer que o principal responsável da situação da Renamo hoje é o próprio [Afonso] Dhlakama", afirmou o reitor da Universidade de Moçambique (UDM), Severino Ngoenha.
Este filósofo de formação considera que a Resistência Nacional Moçambicana (Renamo) está dividida em duas alas: uma política, dirigida pelo líder eleito do movimento, Ossufo Momade, e outra militar, comandada pelo líder da autointitulada Junta Militar da Renamo, Mariano Nhongo, que contesta o presidente da organização.
"Hoje, a Renamo está claramente dividida, e essa divisão não é só entre Nhongo e Ossufo Momade", acrescentou aquele académico.
Nota-se, prosseguiu, que há um setor do partido que está no parlamento, e um outro que está nas zonas rurais. Ambos não se identificam um com o outro.
"Temos uma Renamo do parlamento, com vencimentos e privilégios altos, e a Renamo confinada no interior, que está no campo", destacou o reitor da UDM.
Severino Ngoenha referiu que o estilo autocrático com que Afonso Dhlakama dirigiu o partido ao longo de 39 anos em que esteve à frente da organização minou a construção de uma linha de sucessão à altura da projeção nacional do partido e do seu estatuto de alternativa credível à Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), partido no poder há 44 anos.
"Uma organização política não é uma organização de um individuo, não é de um messias, o chefe de um movimento é um primeiro entre iguais", observou Severino Ngoenha.
Com Ossufo Momade, não se vislumbra na Renamo uma dinâmica de debate que permita que o partido se assuma como alternativa à Frelimo, notou Ngoenha.
"E é pena, porque nós precisamos da Renamo como um movimento forte e não como movimento de guerrilha, não como movimento de antigos combatentes", assinalou.
A solução, continuou, passaria por Ossufo Momade reinventar-se e afirmar o seu poder no partido ou pela emergência de um impulso reformador dado por uma ala jovem.
Por seu turno, o fundador e primeiro reitor da Universidade A Politécnica, a primeira privada do país, Lourenço do Rosário, considerou que a Renamo não conseguiu ultrapassar o "luto" causado pela morte de Afonso Dhlakama, porque prevalecem fortes divergências internas.
"A Renamo não fez o luto, politicamente, e militarmente tem Nhongo a morder-lhe os calcanhares, é um problema político que a Renamo tem de resolver", declarou Lourenço do Rosário.
A organização e estruturas de direção da Renamo assentavam em Afonso Dhlakama e a sua morte trouxe à superfície as fragilidades do partido, frisou Lourenço do Rosário.
O académico salientou que o atual líder da Renamo não tem o carisma do seu antecessor, não tem autoridade sobre o braço armado do partido e errou ao apressar reformas na estrutura da organização, sem ter consolidado o poder.
"O facto de Ossufo Momade ter ido viver no quartel-general da Renamo em Gorongosa era para fazer o trajeto propedêutico para poder ganhar a estrutura militar do partido até ao congresso, mas isso, na prática, não aconteceu, porque uma parte dos militares não o aceita como líder", observou Lourenço do Rosário.
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